18 junho 2008

Desabafo de (quase) final de ano lectivo

Contrariamente a Miguel Sousa Tavares, Emídio Rangel, António Ribeiro Ferreira e tantos outros, eu não falo do que não conheço. Por isso posso falar de educação. São 36 anos de vivência diária.
Desde o 25 de Abril que o entusiasmo com que ia para a escola começou a diminuir. Seguiram-se tantas reformas quantas as vezes que o Governo mudou de cor. Não há quem aguente tanta reforma nem quem aceite qualquer tipo de avaliação de qualquer destas reformas. Em nenhuma delas o Ministro da Educação teve qualquer tipo de ligação com o ensino não superior. Curioso, não? Esta Ministra conseguiu ser o pior que a educação já teve. Fez o que não admito que se faça a ninguém – roubou a tantos professores o prazer que tinham em exercer a profissão que escolheram. Hoje, para mim, é penoso ir trabalhar. Apesar de ter sido provida como professora titular, não posso aceitar a profunda arbitrariedade com que esse concurso decorreu nem o facto de me terem “deitado ao lixo” vinte e muitos anos de carreira onde exerci todo o tipo de cargos. E se não lhe contassem para nada os anos em que foi Ministra? Gostava? Aceitava sem mais?
Neste momento não sou professora tal como eu entendo a profissão. Sou transmissora de toneladas de conteúdos programáticos. Tive este ano que, em pouco mais de 60 segmentos de 45 minutos, dar um programa que demoraria, pelo menos 100 e até a última aula foi toda aproveitada para cumprir o programa. Nestas condições, a parte prática teve que ser prejudicada. É bom de ver que miúdos do 7º ano, demoram muito mais tempo a realizar as experiências do que eu. E o programa é para ser cumprido. Há que dar a correr. É evidente que nada é consolidado e a avaliação tem que ter isso em conta.
Numa idade em que os miúdos estariam predispostos a aderir à Ciência, são bombardeados com conteúdos programáticos dados à pressão. E, além das Ciências Físico-Químicas, têm mais doze disciplinas. Sim. Os miúdos têm 13 (treze) disciplinas. A mochila dos miúdos tem um peso inaceitável.

“Não há milagres” – os milagres podem ser construídos Sra. Ministra.
“Para aprender é mesmo preciso estudar” – é verdade Sra. Ministra mas ter que cumprir metas de sucesso não leva a isso.
“Para melhorar os resultados é mesmo preciso trabalhar mais... - perfeitamente de acordo Sra. Ministra.

"... e o que os resultados revelam é que têm sido anos de trabalho persistente” – os resultados não revelam isso apesar de estarem a ser anos de trabalho acrescido. Mas o trabalho persistente é com burocracias, com preenchimento de papelada e mais papelada, com leitura de legislação que chega a toda a hora, com reuniões, com grelhas e mais grelhas, com preparação de Actividades de Apoio aos Alunos a que os mesmos não comparecem, com a resolução de problemas disciplinares, com a avaliação dos professores, com a implementação da nova gestão das escolas, com tanta e tanta coisa que de nada serve e rouba tempo para o essencial – a preparação das aulas e dos alunos.
Quando se retiram os alunos mais fracos para os Cursos de Educação e Formação e Cursos Profissionais, se estipulam metas de sucesso e se elaboram exames de uma facilidade escandalosa (dito pelos alunos), consegue-se o milagre de que este Governo se orgulha. As estatísticas são correctas mas a ignorância é cada vez maior. Estão a qualificar-se milhares de analfabetos ou, politicamente falando, iliterados.
A Sra. Ministra está no bom caminho. Pode conseguir o milagre do sucesso total. Basta que decrete a meta de 100% de sucesso.
Já não é para mim. Vou-me embora. Nunca pensei acabar desta maneira a minha carreira profissional. Mas ficar era masoquismo. Há mais vida para além disto.

2 comentários:

Parapeito disse...

Como eu entendi o teu desabafo...Mas sim minha linda... "Há mais vida para além disto."
Toca de seguir em frente...ainda tens muitas outras coisas para fazer ...

Um fim de semana fresquinho***

GP disse...

Obrigada pelo apoio parapeito.
Claro que vamos seguir em frente. A visa está aí...

beijinho