03 dezembro 2006

As marcas do tempo

"... Eu olhava para o corpo de Hannah, repousado ao pé de mim. A pele, aqui e ali, fazia lembrar já o pergaminho mas isso não me afastava dela. Sentia uma espécie de respeito, um respeito que se tem por uma coisa que se enriqueceu com o lento trabalho do tempo e, por isso, ressuma paz, serenidade, ternura e a sabedoria de quem foi capaz de testemunhar histórias de generosidade, de dor, de prazer. Os meus olhos não conseguiam separar aquele corpo do tempo que o tinha feito assim e enternecia-me com aquelas rugas, com aquelas marcas de filhos gerados, com aquele peito caído como uma vénia a quem está pronto a amá-lo. Tive um arrepio de comoção e disse-lhe:
- É tão bonito um corpo assim como o teu, assim escrito com as coisas do tempo e da vida..."

Devíamos ser capazes de assistir ao envelhecimento dos que nos são queridos com esta visão de Alçada Baptista.

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