Era o nome de uma das minhas crónicas, publicada em Agosto de 2002. Apeteceu-me publicá-la aqui. Quem tiver a educação como uma preocupação e tiver paciência pode avaliar da actualidade do que eu escrevi há mais de 5 anos.
"Li, há tempos, num jornal diário uma frase de um realismo dramático. “Os professores têm, cada vez mais, à sua frente um conjunto de órfãos de pais vivos.” A formação dos nossos jovens como pessoas, como profissionais e como cidadãos está, em grande parte, na mãos dos educadores. Os educadores por excelência deveriam ser os pais e os professores. Grande responsabilidade para ambos terem nas mãos o desenvolvimento de capacidades, conhecimentos, atitudes e valores nos jovens que serão os homens e as mulheres de amanhã. A família, que devia ser o esteio do jovem, é talvez a instituição básica mais minada. Está em completa desagregação. A tensão da vida de hoje é propícia ao desenvolvimento de conflitos. Não é fácil conseguir disponibilidade para dar atenção, escutar, dialogar. Mas é possível. Sem entendimento e aceitação dos diferentes papeis e funções dos elementos que constituem a família, torna-se difícil o relacionamento entre pais e filhos. A falta de disponibilidade dos pais para darem atenção aos filhos, as famílias monoparentais, os pais divorciados que não sabem gerir com bom senso essa situação, o marido da mãe, a mulher do pai, os meios irmãos,... levam a que, consciente ou inconscientemente, por vezes como uma compensação, se dê às crianças e aos jovens o fruto das conquistas da civilização sem que eles aprendam a dar-lhes o seu real valor.
Com a falta de tempo, ou a desculpa da falta de tempo, muitos pais demitiram-se das suas funções de educadores por excelência. Depositam os filhos, primeiro no infantário, depois no jardim-de-infância e mais tarde no “adolescentário” para que os professores desempenhem, na totalidade, o papel que em grande parte lhes competia. Tarefa esta que deve começar no berço. Na escola já é tarde para a iniciar. A complexidade da vida dos pais de hoje torna difícil a sua tarefa de acompanhamento dos filhos. Mas não a torna impossível. Assim haja vontade. Tão pouca comunicação humana numa época de tão grande informação difundida! Há muita paternidade/maternidade irresponsável. Ter um filho não é pô-lo no mundo e deixar que o mundo lhe incuta valores, o ensine e o insira na sociedade. É preciso abdicar de muita coisa. É preciso alterar hábitos. É preciso estabelecer prioridades. É preciso impor regras. Pelos filhos e pelos próprios pais já que, mais cedo ou mais tarde, eles vão ser vitimas da falta de atenção que deram aos filhos. Em quase todas as famílias, o pai e a mãe trabalham. Se o tempo é pouco, há que aproveitar muito bem esse pouco. Mas é mais fácil, dá menos trabalho, tomar a atitude comodista de deixar os filhos entregues a si mesmos, pondo-lhes ao dispor toda a espécie de entretenimento sem qualquer critério. E pelo comodismo dos pais está a pôr-se em risco o futuro dos filhos.
Fala-se agora muito em responsabilizar os pais. Como se faz isso? Com uma repreensão escrita? Um castigo? Uma multa? Uma queixa na polícia? Os governantes enchem a boca com “responsabilizar os pais” mas não dizem como. Considero que os pais ou são responsáveis ou não são e ponto final. Como os professores. Ou são responsáveis ou não são e ponto final. Como os políticos. Como os advogados. Como os empreiteiros... como todo e qualquer profissional deste país. Um país onde grassa a irresponsabilidade. Onde nunca ninguém foi sancionada por não ser responsável. Onde o responsável leva o carimbo de lorpa. Enquanto tivermos a sociedade que temos, não vislumbro solução para o problema. Os jovens de hoje têm os pais na geração do pós 25 de Abril. Uma geração que teve uma educação/formação deficiente. São hoje os jovens adultos cujos filhos têm, na melhor das hipóteses, a formação que eles tiveram.
Os jovens chegam às mãos dos professores numa etapa da vida que será decisiva para o seu futuro pessoal e profissional. Jovens sedentos de atenção e carinho que, muitas vezes, procuram no professor. Em determinados professores. Porque nem todos os professores, infelizmente, estão dispostos a dar aos alunos tratamento de filhos. Os jovens querem do professor aquilo que as famílias lhes não dão. Muitos professores são, quer queiram ou não, um substituto dos pais. Deviam estar preparados, querer, e ter condições, para exercer mais esse papel. Lidar com jovens nem sempre é fácil mas há professores privilegiados que nasceram com o dom de tornar quase tudo fácil nesse relacionamento. E que se esforçam por pôr a render esse dom que lhes foi concedido.
É bom que os pais sejam exigentes com a escola. Ela deve cumprir convenientemente o seu papel. Mas a escola não é tudo. 'Quem julgar que a escola resolve todos os problemas da sociedade moderna, comete um erro enorme. Enorme. A escola é apenas um dos elementos com que podemos contar, e como há escolas boas, há escolas más, jornais bons e maus, televisões boas e más. Não se queira, quando há um problema, responsabilizar a escola. E os pais?' ( Marçal Grilo). Os pais têm que ter um papel na educação dos seus filhos. Não têm moral para exigir da escola quando não são exigentes consigo próprios enquanto pais.
Que bom seria se houvesse diálogo entre pais e filhos! Bom para os filhos, para os pais e para os professores. E, mais tarde, para a sociedade e para o país. A maioria dos jovens que têm uma família que os ame, e acompanhe o seu desenvolvimento, têm poucos problemas na escolaridade. O sucesso escolar começa em casa."
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